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Sándor Ferenczi: Pioneiro e atual

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Por OSVALDO LUÍS BARISON

Membro do Grupo de Estudos de Psicanálise de São José do Rio Preto e Região

De todos os psicanalistas, o húngaro Sándor Ferenczi, foi o que gozou de maior intimidade e proporcionou as melhores trocas teóricas com Freud (Jones, 1989, p. 184). A importância e participação dele no movimento psicanalítico é algo que não se pode negligenciar, apesar de ter sido isto o que várias gerações de analistas fizeram com sua pessoa e obra. 

Sua morte prematura e o envolvimento de seu nome e legado em intrigas institucionais e afetivas, privaram a comunidade psicanalítica de conhecer e usufruir de um dos pensadores mais originais, criativos e extremamente comprometido com a causa psicanalítica e com os pacientes que recorrem buscando ajuda na experiência de análise. 

Nos últimos anos tenho apresentado algumas ideias e textos dele em nosso Instituto e em algumas reuniões na Sociedade e fora dela.  É impressionante o impacto que o contato com sua obra desperta em quem se dispõe a conhecê-lo. Não encontrei até agora algum Membro filiado ou colega que não se tenha curvado aos ensinamentos do professor que ele é. 

Sua contribuição à nossa história está consolidada em diversas ações que hoje em dia entendemos como naturais. Vale lembrar que enquanto Freud propunha que um aspirante a psicanalista deveria começar por analisar seus próprios sonhos, fazendo assim a autoanálise, Ferenczi foi o colega que propôs a análise didática, ou seja, que o candidato se analisasse com alguém mais experiente. Criou-se desta maneira uma das instituições mais importantes da psicanálise. A análise didática é marca distintiva da nossa profissão e diferencial inclusive dentro das formações no movimento psicanalítico. 

Contudo, ao constatar que a análise didática estava se desviando para uma “análise pedagógica”, foi Ferenczi que deixou clara a diferenciação entre supervisão e análise, separando as duas frentes da formação. Posteriormente propôs a ampliação do tempo das análises, que na época duravam em torno de um ano, afirmando que deveríamos ser mais bem analisados do que nossos pacientes. Inclusive é dele a máxima de que “uma boa técnica analítica é a análise terminada do analista”, ideias que concordamos até hoje.  

Ainda no campo institucional, foi ele quem propôs a criação da IPA e que até hoje organiza parte do movimento psicanalítico ao redor do mundo e que continua em franca expansão como instituição, marcando cada vez mais seu lugar na História. 

A chamada “clínica contemporânea” é visivelmente ancorada em seus textos, experimentos, erros e acertos. Salta aos olhos a atualidade de seus temas, inquietações e tentativas de ampliação do alcance do tratamento psicanalítico para além dos casos neuróticos; para os trabalhos institucionais e para as ampliações da técnica. 

 

É possível fazer uma classificação entre duas grandes correntes de psicanálise: uma primeira que visa ao conhecimento, à elucidação, à atribuição de sentidos simbólicos como forma de conhecimento do inconsciente e possível libertação para uma vida mais livre. Esta forma de se conceber o trabalho analítico recebeu recentemente um nome dado por Thomas Ogden, definindo-a como “psicanálise epistemológica”. Uma segunda concepção que privilegia a relação afetiva entre a dupla analítica, acreditando que a experiência emocional que o par vivencia é a maneira que temos para desenvolver aspectos primitivos e/ou traumáticos que ainda não alcançaram significação. A esta forma Ogden chamou de “psicanálise ontológica”. Grosso modo, podemos dizer que Freud é patrono da primeira e Ferenczi da segunda. 

Ao olharmos para a história da psicanálise, percebemos que seu desenvolvimento se dá exatamente na tensão entre estas duas grandes correntes de posicionamento. Por vezes privilegiamos o intrapsíquico, os objetos internos e a pressão pulsional. Em outros momentos ganha relevo a realidade externa, o ambiente e a relação interpsíquica. 

Nascido em Miskolc, na Hungria, em 07 de julho de 1873, estamos comemorando o 149º aniversário deste pioneiro. Homem que, nos dizeres de Freud, valia por uma sociedade inteira, que todos nós deveríamos nos sentir como seus alunos e que “é impossível imaginar que a história da nossa ciência algum dia venha a esquecê-lo” (Freud, 1933/1996) .

Um clínico inquieto, que não aceitava a ideia de que existem pacientes que não podem ser analisados, assumindo para si a responsabilidade de adaptar a psicanálise para cada caso específico. A demanda é a do paciente e somos nós que devemos nos adaptar a ele, assim como é a família que deve se adaptar ao bebê que nasce. Ao fazer isso, ele se expôs ao extremo na busca de uma metodologia e técnica que minorasse o sofrimento psíquico. 

Atualmente ele já foi retirado do ostracismo, principalmente nas Universidades e nas instituições públicas de saúde metal. Porém ainda esperamos que se restitua o lugar que lhe é devido na história da nossa ciência, principalmente nas instituições filiadas à IPA. 

O importante é a apreensão de que o conjunto de seus conceitos e as suas experiências clínicas ainda têm potência para nosso trabalho hoje, e que podem nos ajudar a trabalharmos melhor e mais próximos de nossos pacientes. Podemos afirmar que o manejo da técnica está na ordem do dia da psicanálise, e vem daí a grande contribuição do nosso aniversariante. 

 

Trabalho apresentado no Blog da SBPSP  

Referências:

Freud, S. (1996). Sándor Ferenczi. In Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud: Vol. 22. Novas conferências introdutórias sobre psicanálise e outros trabalhos (1932-1936) (pp. 221-225). Imago. (Trabalho original publicado em 1933)

Jones, E. (1989). A vida e a obra de Sigmund Freud: Vol. 3. Última fase (1919-1939). Imago. (Trabalho original publicado em 1957)

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